Editorial
O debate atual que envolve a proposta audaciosa de um projeto de lei que desautoriza o casamento homoafetivo no Brasil tem acirrado discussões calorosas, nas quais o respeito pelas diferentes expressões de amor, princípio fundamental para o desenvolvimento harmonioso da sociedade, parece estar em jogo. A iniciativa, que tem seus laços estreitados com a bancada cristã, é um desvio gritante dos preceitos constitucionais do país.
O Brasil é um Estado laico, o que significa que não possui religião oficial e que é garantida a liberdade de crença a todos os seus cidadãos. Essa característica do país é incontestavelmente estabelecida pelo Artigo 19, inciso I da Constituição Federal, que veda qualquer tipo de estreitamento entre Estado e religião. No entanto, algumas ações políticas, como é o caso desta proposta de desautorização do casamento homoafetivo, põem em cheque a laicidade do Estado brasileiro.
A bancada cristã, ao operar para dificultar a viabilização do casamento igualitário, faz uma utilização preocupante do chamado "capital político". Esse termo, bastante em voga nos estudos da ciência política, denota a influência que um político ou grupo político possui perante a sociedade e outras instâncias do poder. Obtido através de relações interpessoais, histórico de sucesso, popularidade e outros fatores, o capital político se converte em poder de barganha, ou seja, capacidade de conseguir que as coisas sejam feitas.
É imprescindível refletir como esse capital está sendo usado. Na presente situação, vemos o paradoxo de ele estar sendo aplicado contra os próprios princípios da democracia e do Estado laico, os quais garantem a liberdade de religião, mas também o livre exercício dos direitos civis por todos, independente de crenças pessoais.
A tentativa de impor uma moral de cunho religioso é não só uma afronta à pluralidade, como também um perigoso precedente. Se aceito, pode abrir caminho para ainda mais violações dos direitos dos que pensam diferente da maioria.
Em suma, é fundamental lembrar a todos os atores desta discussão que o "capital político" não deve ser usado para desconstruir os avanços sociais conquistados. Projeto de leis que busquem restringir os direitos dos cidadãos devem ser encarados como uma manobra política que, em vez de beneficiar a população, prioriza o fortalecimento de um grupo em detrimento de outro. Não podemos permitir que questões profundamente pessoais, como a orientação sexual e o casamento, tornem-se ferramentas na busca por poder político. Isso é desviar o foco da verdadeira função da política que é ser um instrumento de coesão social, promovendo o respeito, tolerância e a diversidade.
Por Klebinho Branco